quarta-feira, 1 de abril de 2009

Alice encontrou sua caixa de lembranças. Revirou seu pouquinho de história, suas memórias esquecidas. Achou o diário da adolescência. Leu: "E chega uma hora em que as coisas não fazem mais sentido. E outras coisas fazem sentido. O lugar, o coração têm outro sentido. O lugar, o sonho, a identidade. Os gostos, as alegrias, os medos. Fazem do lugar mais lugar. A riqueza do momento. O pai, a mãe, a irmã. E tudo se transforma em chuva de individualidade. Um mar de descobrimento e a tranquilidade de se conhecer. Transparente e opaca. Mudança e dúvida e mudança. A timidez, o amor, os amigos. Os raros caprichos em meio à tolerância. Os sentimentos feios e bonitos. A alegria de permitir pensar feio como rebeldia a todos os rótulos adequados e incabíveis. E o pensamento bonito mais presente que o pensamento feio. Antes virgem pálida, agora interessante? Talvez interessante por fora, talvez com medo por dentro. Antes sozinha e sem identidade. Agora acompanhada. Com identidade, ou sem identidade? Amor como brisa ou tempestade? Convencional ou moderno? Para sempre? Para sempre e momentâneo. Seguro e impactante. O lugar. O espaço. A fraqueza entendida, temerosa, mas feliz já que entendida e clara. Mais leve. Pesada também. Sem certeza do que é ou vai ser. Com medo do que vai embora. Feliz com outras coisas". Alice pensou. Não entendeu algumas coisas. Pensou. Leu. Se reconheceu. Embora muito tivesse mudado, lembrou, entendeu. Ali estava ela. Igual e diferente. Percebeu que continua com medo. Talvez outros, talvez os mesmos. Talvez tenha medo e nem saiba exatamente de que. Mas sabe que, embora não queira, sua atitude ainda é de pouca coragem. Sabe que os sonhos ainda são poucos, são confusos, mas sabe que tem um pouco mais certeza de quem é, da sua identidade... Dá risada dela mesma. Se achava interessante? Ah, Alice não era interessante, agora sabe disso. Tantos e tantos medos, tão poucos caprichos. Mesmo assim, conseguiu algumas amizades. Com toda sua dificuldade de sociabilidade, Alice se orgulha dos amigos que conquistou. Alguns ainda continuam até hoje ao seu lado. Da timidez ela sabe que, em parte se livrou, mas sofre quando vê que ela ainda aprisiona, ainda fere. Pelo menos, se permite ter os pensamentos feios e sinceros. Aqueles pensamentos que foi ensinada a nunca poder sentir. Agora, a mãe ou a avó não os reprimem. Pra dizer a verdade, elas nem os conhecessem. Sabe que tem ciúme, sabe que sente inveja. Talvez agora, sinta mais do que antes. Agora se permitiu. Mas ainda é difícil admitir que os tem. Alice sabe que é desconfiada. Não sente-se confortável com quem acabou de chegar. Mas é só no início, depois, se destranca do seu mundo e abre a porta para o novo entrar. Os gostos também mudaram. Quanto ao amor e ao lugar... Ai, ainda não sabe onde colocar. Medo?

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